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Maricá: Jornada Indígena teve quatro dias de esporte, cultura, interação e aprendizado

“Estamos aqui pagando uma dívida histórica com os índios”, afirmou o prefeito Fabiano Horta ao visitar a 2ª Jornada Esportiva e Cultural Indígena (Jeci) de Maricá, evento que reuniu tribos do município e de fora em quatro dias de atividades e competições na aldeia Tekoa Ka’ Aguy Ovy Porã (Mata Verde Bonita), em São José do Imbassaí. O evento reuniu 43 atletas de 15 tribos de diferentes partes do país, disputando nove modalidades esportivas. Houve ainda shows musicais e folclóricos, sessões de cinema, exposição de fotos, debates e também barracas de comidas típicas e lanches.

A maior vencedora deste ano foi a aldeia guarani Boa Esperança, do Espírito Santo, que foi primeira colocada em seis modalidades, cinco das quais conquistadas por um único atleta. Leandro Karaimiri, de 26 anos, venceu no arco e flecha, na corrida rústica, na natação, no salto em distância e no arremesso de lança. No dia da premiação, realizada domingo (23/04), teve dificuldade para levar os troféus e medalhas (sete), que incluíam a de prata no cabo de guerra e o bronze no futebol. Quando perguntaram a Leandro qual era o segredo de sua performance, ele não teve dúvidas: “Como muito caranguejo, dá energia”, garantiu. As aldeias Mata Verde Bonita (guarani) e Pataxó ficaram com duas modalidades vencidas.

Além do esporte, a jornada contou com atrações culturais como as exposições fotográficas de Cordelia Fondeau e Dionedison Terena, nascido na tribo de mesmo nome em Mato Grosso do Sul. Segundo ele, que esteve no local na sexta-feira (21/04), suas fotos têm um caráter de denunciar a violência sofrida pelos índios daquela região. “As fotos foram feitas em áreas de ocupação, onde os povos lutam contra os produtores de grãos para manterem suas terras preservadas”, relatou ele, afirmando que Maricá dá um grande exemplo para o país. “Vamos levar esse modelo para nossa região e mostrar aos governantes de lá”, prometeu.

A jornada também contou com plantio de mudas de árvores nativas da região. As espécies – do viveiro da Subsecretaria de Meio Ambiente, que também abastece o programa Maricá+Verde – foram plantadas pelos caciques – entre eles o da própria aldeia, Darci Tupã – pelos curumins, pela primeira-dama Rosana Horta e pelo secretário municipal de Economia Solidária, André Braga. Quem também deixou uma muda plantada foi o advogado Ilmar Renato Fonseca, mais conhecido como o ex-BBB Mamão. Especializado em direito indígena, o sul-matogrossense presta assessoria jurídica aos povos da região na luta pela terra.

Segundo ele, uma de suas metas no reality show era divulgar a causa. “Acho que atingi esse objetivo, de mostrar que os índios hoje vivem quase um confinamento em suas próprias terras. Para eles, a terra é uma mãe, não uma mercadoria como nós a tratamos. Também não podemos mais tratar os indígenas como indigentes”, frisou Ilmar, que elogiou a iniciativa da Prefeitura de Maricá. “Temos aqui um grande exemplo de como o poder público pode mudar essa relação e estar mais presente com os povos”, avaliou. “Ações como essa reafirmam o valor da interação e das relações de afeto que temos com o povo indígena, uma experiência que nos enriquece”, declarou o prefeito Fabiano Horta.

Mesmo com a mudança no tempo no sábado (22/04), a animação dos atletas e do público não diminuiu. As primeiras competições foram de luta corporal e tiro com arco, utilizado na segunda modalidade, que foi aberta pela atleta olímpica maricaense Anne Marcele Santos (9° lugar na Rio 2016) e pelo cacique Félix, da aldeia Sítio do Céu, em Itaipuaçu. À tarde, foi a vez de outras três modalidades. No cabo de guerra, as equipes anfitriãs venceram as três categorias (masculino, feminino e infantil) e foram vice-campeãs nas categorias individual e de duplas da corrida de toras, onde os atletas carregaram troncos de madeira pesando 80 quilos. Nesta modalidade, as tribos vencedoras foram a pataxó (no individual) e a Bracui (nas duplas). Na corrida de MBaraka, venceram as tribos Marangatu (masculino) e Boa Esperança (feminino). O último dia de competições teve muita chuva, mas as disputas continuaram acirradas e consagraram Leandro Karaimiri, da aldeia Boa Esperança, que venceu na corrida rústica, na natação, no salto em distância e no arremesso de lança.

Os visitantes adoraram a experiência. “Minha bisavó era uma índia do Nordeste, tenho um pouco dessa origem. Aqui é como eles são de verdade”, observou Laís Vitória Barbosa, de 11 anos, que cursa o 5° ano da Escola Municipal Professor Oswaldo de Lima Rodrigues, que fica na Estrada dos Cajueiros. “Vê-se que é uma área só deles. É muito interessante estar aqui, ver como eles vivem”, disse o professor Frederico Lima, de 58 anos, que cursa pós-graduação em Cultura Indígena pelo CEFET. Ele veio de Teresópolis com a turismóloga Jackelyn Vieira, de 23 anos, que contou já ter visitado uma aldeia pataxó no sul da Bahia. “Lá se paga até entrada, tem um roteiro para seguir, mas aqui você fica a vontade, interage livremente com os índios. Gostei de conhecer”.

A professora de Educação Física Catarina Prima, de 32 anos, foi mais longe e aplicou algumas modalidades a seus alunos. “Eu os coloquei para praticarem alguns desses esportes, que são diferentes do que eles estão acostumados. Creio que seja um aprendizado para eles e para mim também”, disse ela, que estava com o marido, o também professor Felipe Prima, de 33 anos, e os filhos Helena, de 4 anos, e João, de 3. “É uma interação cultural que nos enriquece muito, acho importante para eles”, afirmou. Morador de Alcântara, em São Gonçalo, Gilberto Carvalho Damasceno esteve na aldeia não somente pela curiosidade. O pastor evangélico de 47 anos é também estudante de História e disse ser um amante das culturas africana e indígena. “Tenho um enorme interesse por esses assuntos porque prego um cristianismo inclusivo, sem nenhum preconceito. A prefeitura está de parabéns por esta grande iniciativa, de dar o apoio que os índios precisam e promover esse evento”, frisou ele, que estava com a esposa Sônia Damasceno, de 43 anos.

Um clima de emoção e despedida marcou a cerimônia de premiação na noite de domingo. Ao final, o cacique Darci Tupã agradeceu ao empenho da prefeitura na realização do evento. “Sou um índio privilegiado neste país tão desigual por ter este espaço. Isso renova a esperança de nossos irmãos, que saem daqui felizes”, avaliou ele. Já a secretária de Cultura, Andréa Cunha, exaltou a união e o empenho dos diversos órgãos do governo municipal. “Todos mostraram uma interação fundamental para que isso acontecesse, e teve uma enorme repercussão em toda a cidade e fora dela”, revelou.

Entre os shows que incluíram artistas locais e de tribos participantes, o destaque foi a apresentação do cantor e compositor Guilherme Arantes, que levou um repertório de mais de 40 anos de carreira. No palco, ele tocou sucessos como “Planeta Água”, “Meu Mundo e Nada Mais”, “Êxtase”, “Deixa Chover”, “Cheia de Charme”, “Lance Legal” e “Lindo Balão Azul”, entre muitos outros. A abertura foi com “Amanhã”, um hino à esperança que complementou sua mensagem. “Que haja lugar no Brasil para todas as etnias, principalmente para a etnia que é originária do Brasil”, declarou o artista.

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