Itaipuaçu foi palco do primeiro golpe do “rei dos empréstimos”, preso pela Polícia Federal após fraude bilionária

As informações foram reveladas em reportagem exibida pelo programa Fantástico, da TV Globo, no último domingo (24/08). O esquema, que movimentou mais de R$ 2 bilhões, teve início em Itaipuaçu, distrito de Maricá, ainda nos anos 2000.
Um empresário fantasma, identificado como Jobson Antunes Ferreira, de 63 anos, ficou conhecido como o “rei dos empréstimos” após abrir 334 empresas que só existiam no papel, recrutando “laranjas” até mesmo entre pessoas em situação de rua.
No momento da prisão, Jobson alertava comparsas sobre a necessidade de destruir provas:
“É bom ver um advogado. Eles podem não ter achado o endereço, mas já é a hora de você apagar as mensagens, deixar nada que te incrimine aí, mano. Evitar o máximo de prova contra você.”
Jobson, ex-oficial da Marinha Mercante, também usava identidades falsas com nomes como Afonso Martins, Domingos Sávio, João Batista e Gilson Ferreira, além de mais de 30 outras variações. Segundo a investigação, ele tinha o apoio da esposa, Cláudia Márcia, que também usava documentos falsos.
“A minha esposa assinando fica perfeito. Letra de mulher, meu amigo, fica igualzinho. Ela já treinou e tudo”, disse Jobson.
Esquema começou em Itaipuaçu
De acordo com a Polícia Federal, o primeiro golpe aconteceu em Itaipuaçu, no início dos anos 2000, quando Jobson tinha uma loja de material de construção em dificuldades financeiras. Para conseguir empréstimos, começou a abrir empresas fantasmas no mesmo endereço, com diferentes CNPJs. O esquema se expandiu e passou a contar com contadores, gerentes de bancos públicos e privados.
“Eu vou logo te dizer, eu costumo dar 5% para gerente e normalmente vou dar 5% para você. Porque tudo tem que ser pago, né, querida? É um agrado. É uma retribuição aí pelo trabalho.”
O delegado Bruno Bastos Oliveira resumiu o caso:
“A gente descobriu que ele geria uma verdadeira empresa do crime.”
Laranjas e empresas de fachada
Segundo a PF, contadores transferiam empresas antigas para o nome de laranjas, mantendo-as como fachada. Em alguns endereços, havia até 30 empresas registradas, todas apenas no papel.
“As empresas não tinham qualquer produção, elas não vendiam qualquer produto. Elas simplesmente existiam de forma contábil. Então estavam todas regulares, só que não tinha um funcionário, não tinha nenhum produto, não tinha nenhum estabelecimento”, explicou o delegado Bruno Bastos.
Jobson recrutava laranjas até entre moradores de rua, alguns dos quais reclamavam por falta de pagamento.
“Bom dia, mestre! Logo no começo, aquela primeira vez que eu fui aí, que nós agilizamos negócio de documento e tal, o Leandro me deu mil reais, pô! Até hoje, entendeu? Já vai fazer três meses!”
Jobson respondia:
“E lembro muito bem, tá no áudio. Ele falou: pode usar o meu nome à vontade, eu só quero o meu dinheiro. E eu te dei e te dei mais. Meu irmão, não abusa não, cara.”
Até gerentes de banco recebiam vantagens.
“O ideal é dinheiro, mas nem sempre começa logo de cara com dinheiro. Tem uns que a gente começa dando uísque, depois eu dou um celular, daqui a pouco é com dinheiro, tudo certo.”
Prisão e novas denúncias
Preso em 2024 após um laranja ser flagrado tentando sacar dinheiro com documento falso, Jobson passou seis meses na cadeia e saiu com tornozeleira eletrônica, mas continuou o esquema. Ele foi novamente detido na última quinta-feira, junto da esposa, em um condomínio de luxo em Piratininga, Niterói. O imóvel teria sido comprado para lavagem de dinheiro.
Na delegacia, ainda tentou subornar o delegado:
“Será que não tem como me ajudar?… Eu vou gastar um dinheiro no advogado… Não posso gastar aqui? E se eu puder fazer alguma coisa, deixar contigo… aí você que tem que falar quanto. Dinheiro!”
O delegado respondeu:
“Você tá preso por corrupção ativa, tá? Você me ofereceu dinheiro…”
Mesmo assim, Jobson se gabava:
“Eu fui tentando abrir uma brecha, mas o delegado não deu e eu não posso dizer que eu não tentei. Eu tentei, mas o delegado cortou e me prendeu.”
O delegado Bruno Bastos comentou:
“Aqui na delegacia ele expôs o modo que fazia. Ele detalhava cada fraude e sem nenhum constrangimento. Ele se gabava disso, achava que não fosse ser pego.”
Jobson e Cláudia Márcia responderão por estelionato qualificado, organização criminosa, lavagem de dinheiro e financiamento fraudulento.
Em nota, o advogado Jair Pilonetto, que defende o casal, afirmou que “os acusados não cometeram os crimes imputados a eles e que a inocência dos dois será comprovada no decorrer da instrução processual”.
A Febraban também se manifestou:
“Repudia qualquer envolvimento de funcionários de bancos em ações criminosas e realiza treinamentos periódicos com seus funcionários para que identifiquem e reportem transações suspeitas.”
E o próprio Jobson resumiu em interrogatório:
“Não vou dizer que eu sou santo.”