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Fenômeno natural em praias de Maricá encantam banhistas; saiba como se formam

Imagine chegar à praia após dias de mar agitado e encontrar, logo ao lado das ondas, uma imensa piscina natural de água salgada estendida sobre a areia, como se fosse um lago paralelo ao oceano. Essa cena curiosa e encantadora não é obra de engenharia, mas sim um fenômeno natural conhecido como lagomar. Com águas represadas e tranquilas contrastando com o mar bravo a poucos metros de distância, o lagomar transforma temporariamente a paisagem costeira e desperta a atenção de banhistas e moradores nas regiões litorâneas onde ocorre.

O que é um lagomar? 📖🌊

O lagomar é, essencialmente, uma lagoa temporária de água do mar formada sobre a faixa de areia da praia. Em termos simples, trata-se de um grande corpo d’água salgado que surge paralelo ao oceano, criando uma espécie de piscina natural à beira-mar. Esse fenômeno ocorre quando as ondas avançam além da linha de costa normal e invadem a praia, escavando a areia e deixando água represada em depressões do terreno. O resultado são “verdadeiros piscinões – às vezes verdadeiros rios – ao longo da praia”, que podem se estender por centenas de metros ou até quilômetros . Em outras palavras, forma-se uma lagoa rasa e temporária alimentada diretamente pelo mar.

Do ponto de vista científico, o lagomar pode ser descrito como uma laguna costeira efêmera. Diferentemente de lagoas permanentes conectadas a rios ou manguezais, o lagomar não tem um aporte constante de água doce nem comunicação regular com o oceano. Ele surge e desaparece em curtos intervalos, conforme as condições do mar mudam. Enquanto existe, porém, é parte do ambiente marinho – sua água é salgada e acompanha o nível da maré, podendo encher mais durante marés altas e esvaziar parcialmente na maré baixa até desaparecer por completo quando o mar recua de vez ou rompe a barreira de areia.

Como se forma o lagomar? 🌀🌬️

O lagomar forma-se tipicamente após eventos de alta energia no oceano, como ressacas marítimas ou marés excepcionalmente altas. Durante uma ressaca – fenômeno em que há ondas muito maiores e mais fortes que o normal –, o mar ganha força suficiente para “invadir a areia” da praia além de seu limite usual . Essas ondas avançam terra adentro, carregando e rearranjando sedimentos, e muitas vezes escavam canais ou depressões na faixa de areia. Quando a agitação diminui ou a maré baixa novamente, a água que avançou sobre a praia acaba ficando represada nessas depressões, dando origem ao lagomar.

Diversos fatores contribuem para esse processo de formação do lagomar:

  • Ondas muito fortes (Ressacas do mar): a principal causa. As ressacas ocorrem geralmente devido a tempestades oceânicas, ventos intensos ou ciclones extratropicais em alto-mar, que geram ondulações grandes. Essas ondas vigorosas quebram com força na costa e podem avançar bem além da arrebentação normal, escavando a faixa de areia e abrindo espaço para a água se acumular  . Por exemplo, em Maricá (RJ), a formação de um lagomar extenso foi “resultado direto da forte ressaca” que atingiu o litoral, com ondas de mais de 3 metros de altura – energia suficiente para remodelar parte da praia e gerar a lagoa natural sobre a areia .
  • Marés altas e fases da lua: quando a ressaca coincide com maré cheia de sizígia (próxima à lua cheia ou nova), o alcance da água na praia é ainda maior. Nessas circunstâncias o mar cobre extensões amplas da areia e, ao recuar na maré vazante, deixa bolsões d’água isolados atrás de bancos de areia formados pelas próprias ondas. Embora o lagomar possa ocorrer em diversas fases, é mais provável e pronunciado em marés excepcionalmente altas seguidas de um rápido recuo.
  • Ventos e meteorologia: ventos oceânicos fortes, especialmente de tempestades, empurram as ondas contra a costa e podem causar avanços anormais do mar. Ciclones extratropicais (sistemas de baixa pressão comuns no outono e inverno do litoral sul e sudeste do Brasil) frequentemente provocam ressacas e sobrelevação do nível do mar, criando condições propícias para o lagomar. Um caso ilustrativo ocorreu em Balneário Camboriú (SC) durante a passagem de um ciclone: “com o avanço do mar sobre a faixa de areia”, formaram-se lagoas semelhantes a piscinas naturais ao longo da praia . Ou seja, a combinação de ondas grandes e persistentes com ventos onshore (soprando do mar para a landa) favorece a invasão da água pela praia.
  • Relevo costeiro (perfil da praia): praias com características específicas tendem a formar lagomares com mais facilidade. Em praias de tombo – aquelas de declive acentuado, onde o fundo aprofunda rapidamente – a energia das ondas é dissipada em uma faixa estreita, e grandes ondulações podem esculpir degraus ou valas na areia. Nessas praias, um lagomar aparece como uma espécie de contraste: onde antes o banhista “dava um passo e já afundava”, agora existe uma piscina rasa e plana sobre a areia . Foi o que se viu, por exemplo, nas praias oceânicas de Maricá, que são majoritariamente de tombo: após uma ressaca, a areia escavada formou um extenso canal paralelo ao mar, preenchido por água salgada, criando uma faixa de banho tranquila junto da orla . Já em praias de perfil mais plano (dissipativas), o fenômeno pode ocorrer também, mas a água tende a se espalhar mais e drenar mais facilmente de volta ao mar, resultando em lagos menores e menos duradouros.
  • Barragens de areia e infraestrutura: às vezes, a presença de estruturas naturais ou artificiais pode contribuir. Montinhos de areia acumulados pela ação do vento ou restos de dunas podem atuar como diques naturais, retendo a água na parte interna. Em praias urbanas que passaram por alargamento artificial de faixa de areia (engordamento da praia), também se observou a formação frequente de pequenos lagos após ressacas enquanto o perfil da praia se ajusta. Engenheiros costeiros explicam que, após obras desse tipo, é “normal ocorrerem pequenas lagoas e escarpas” até que a praia atinja um novo equilíbrio  – o que faz do lagomar parte do processo natural de estabilização do terreno.

Uma vez formado, o lagomar permanece enquanto houver aporte de água do mar nas marés seguintes ou até que o terreno se nivele novamente. Em geral, são formações de curta duração: os especialistas observam que essas lagoas “se formam em período curto e o próprio movimento do mar cobre as mesmas”, dissipando-as naturalmente após dias ou semanas . Ou seja, conforme as ondas voltam ao normal, a água represada acaba drenando de volta para o oceano (às vezes abrindo uma saída na areia) ou infiltrando-se no solo arenoso, e a paisagem retorna ao seu estado original.

Condições ambientais que favorecem o lagomar 🌦️🌊

Como vimos, o lagomar depende de uma conjunção de fatores ambientais. Em resumo, as condições que favorecem sua formação incluem:

  • Marés e ondulação: maré excepcionalmente alta combinada a ondas fortes permite que a água do mar cubra grandes trechos de areia e forme a lagoa. Ressacas marítimas são o gatilho mais comum .
  • Clima e estação: períodos de tempestades oceânicas (no Sudeste/Sul do Brasil, geralmente nos meses mais frios) trazem mais eventos de ressaca e, consequentemente, mais lagomares. De fato, observa-se que o fenômeno tende a ocorrer “com mais intensidade nos períodos frios” do ano, quando frentes frias e ciclones extratropicais são frequentes, diminuindo nos meses quentes de calmaria.
  • Topografia da praia: praias de costa exposta (voltadas diretamente para mar aberto) e com faixa de areia larga fornecem o “palco” ideal. Nessas praias, há espaço para a água avançar e se acumular. Trechos perto de estruturas como molhes ou onde a areia recém-alterada está mais solta podem ter incidência maior de lagomares  . Já praias muito curtas ou protegidas por baías dificilmente verão o fenômeno, pois o mar não tem energia ou área suficiente para invadir.
  • Ausência de drenagem imediata: é necessário que haja algum obstáculo à rápida drenagem da água de volta ao mar. Esse obstáculo pode ser um banco de areia formado pela própria ressaca ou a compactação do solo naquele trecho. Se a água encontrar um ponto baixo por onde escorrer de volta imediatamente, o lagomar pode nem se formar ou será muito efêmero. Por isso, quando o terreno apresenta uma “borda” ou “degrau” de areia após a ressaca, favorece-se a retenção de água e a aparência de “piscina natural” tranquila à beira-mar .

Onde esse fenômeno costuma ocorrer? 🌍🏖️

O lagomar não é exclusivo de uma praia específica – ele pode acontecer em diversas partes do mundo, desde que as condições acima estejam presentes. Em geral, manifesta-se em costas arenosas de mar aberto com forte dinâmica de ondas. No Brasil, tornou-se particularmente conhecido no litoral do estado do Rio de Janeiro, especialmente em Maricá e região dos Lagos, onde trechos extensos de praias oceânicas registram o fenômeno com frequência. Trechos como Itaipuaçu, Barra de Maricá, Cordeirinho e Ponta Negra (todos em Maricá, RJ) são conhecidos por apresentar lagomares após ressacas intensas . Em algumas ocasiões, a lagoa temporária estendeu-se por quilômetros contínuos nessas praias, unindo vários pontos da orla em uma só lâmina d’água calma .

Outra área com registros recentes é o litoral de Santa Catarina, sul do Brasil. Após a obra de alargamento da Praia Central de Balneário Camboriú (SC), formaram-se lagoas na faixa de areia sempre que houve chuva forte ou mar agitado excepcional. Em julho de 2023, por exemplo, um ciclone extratropical elevou as ondas e “a praia Central… registrou a formação de novas lagoas” na orla . Essas aparições tornaram-se comuns na região da Barra Sul daquela praia, sempre após eventos climáticos intensos, a ponto de serem consideradas um fenômeno esperado e monitorado pelas autoridades locais .

Fora do Brasil, fenômenos semelhantes podem ocorrer em costas oceânicas arenosas que sofrem com tempestades. Costas no Atlântico Norte, Pacífico e Índico – incluindo trechos dos Estados Unidos, Europa e Australásia – eventualmente registram lagoas efêmeras formadas por galgamento do mar (overwash) após furacões ou ciclones. Nesses locais, entretanto, o lagomar pode ter outros nomes e muitas vezes faz parte do estudo de dinâmica de barreiras arenosas. O importante é que, seja em Maricá ou em Balneário Camboriú, o princípio é o mesmo: onde o mar bate forte e a praia é de areia, há chance de se formar um “lago do mar” temporário.

Ecologia e turismo: benefícios e cuidados 🌱👨‍👩‍👧‍👦

Do ponto de vista ecológico, o lagomar é uma ocorrência natural e geralmente inofensiva ao meio ambiente costeiro. Ele indica um processo de redistribuição de sedimentos e de resposta natural da praia às forças das ondas. Especialistas ressaltam que o aparecimento dessas lagoas faz parte do “processo de conformação e estabilização da praia” após eventos de grande energia . Ou seja, o litoral está se autoajustando: a areia removida de um ponto se acumula em outro, e a água represada logo retorna ao oceano, sem deixar resíduos. Durante o curto período em que existe, a lagoa pode até criar um micro-habitat temporário: pequenos peixes, caranguejos ou moluscos podem ficar presos ali, servindo de alimento fácil para aves marinhas. No entanto, por ser efêmero, o lagomar não chega a desenvolver um ecossistema complexo próprio – ele é mais um episódio dinâmico da vida da praia do que um ecossistema separado.

Já sob a perspectiva do lazer e turismo, o lagomar costuma ser visto como uma atração bem-vinda. Para os banhistas, é quase como ter um “piscinão” natural à disposição . Em regiões onde o mar aberto é tradicionalmente perigoso para banho (com ondas fortes e correntes), o lagomar cria uma zona de água calma e rasa, ideal para crianças, idosos e pessoas que preferem águas tranquilas. Moradores de Maricá relatam a alegria de poder entrar na água com segurança graças a essas formações naturais inesperadas . Em dias de sol após a ressaca, não é incomum ver famílias inteiras aproveitando a lagoa salgada na praia, como se fosse um parque aquático espontâneo da natureza. A paisagem também se transforma em espetáculo: a água cristalina repousando sobre a areia dourada, em contraste com as ondas quebrando no mar ao fundo, rende fotos deslumbrantes e movimenta as redes sociais e a curiosidade de turistas.

Apesar dos benefícios e da beleza, é crucial destacar os cuidados e riscos associados. Por mais convidativo que o lagomar pareça, ele nasce de um mar que esteve violento há poucos dias – e alguns perigos podem persistir. Correntes de retorno (resaca) podem se formar dentro ou próximo da lagoa, principalmente se ela tiver conexão com o mar em algum ponto. Autoridades alertam que lagomares muito profundos ou extensos podem esconder correntes capazes de “puxar os banhistas para o mar” caso uma barreira de areia ceda repentinamente . Portanto, recomenda-se atenção redobrada: mesmo nas águas aparentemente calmas da lagoa, o ideal é nadar apenas em trechos supervisionados por guarda-vidas e respeitar eventuais bandeiras de alerta na praia . Além disso, o fundo da lagoa é irregular – resultado de erosões – podendo ter pontos mais fundos de surpresa.

Outra precaução envolve a qualidade da água. Logo após a formação, o lagomar contém água do mar limpa. Porém, se a lagoa permanecer por muitos dias isolada e sem renovação, pode sofrer aquecimento e proliferação de algas ou micro-organismos, tornando a água menos própria para banho. Isso raramente é um problema, pois em geral o mar reenche a lagoa a cada maré alta, renovando a água. Ainda assim, os frequentadores devem observar se a água continua cristalina e sem odor. Em caso de dúvidas, é preferível não submergir a cabeça ou engolir água da lagoa.

Em suma, o lagomar é um fenômeno que mescla imponência natural e utilidade recreativa. Encanta os olhos, refresca os banhistas e evidencia a força transformadora do mar, mas requer consciência e respeito aos limites impostos pela natureza. Quando surge, torna-se rapidamente o xodó da praia – um lembrete de que o litoral está em constante mudança e que, de vez em quando, o oceano gosta de fazer uma pausa na sua braveza para oferecer um oásis aos mortais, ainda que temporariamente.

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